Textos para Refletir


III Jesus, O GRANDE VOCACIONADO DO PAI
Frei José Soares da Silva, Ofmcap. (Org.)


01. Partindo da pessoa de Jesus, veremos em outros encontros, inspirados nos dois Testamentos, mais algumas vocações bíblicas.
                Olhando para o próprio Jesus, recordemos a cena simples, mas profundamente significativa, relatada pelo evangelista Marcos: Ora, naqueles dias veio Jesus de Nazaré, da Galiléia, e foi batizado por João no Jordão. No momento em que Jesus saía da água, João viu os céus abertos e descer o Espírito em forma de pomba sobre ele. E ouviu-se dos céus uma voz: ‘Tu és o meu Filho muito amado; em ti ponho minha afeição’ (Mc 1,9-11).
Na força do Espírito Santo, Jesus proclama e difunde a Boa Nova do Reino não somente por palavras, mas sobretudo por meio de suas ações: Jesus percorria toda a Galiléia, ensinando nas suas sinagogas, pregando o Evangelho do Reino, curando todas as doenças e enfermidades entre o povo (Mt 4,23). Nele pode se verificar, sem dificuldades, a existência de uma unidade profunda entre o falar e o agir. Há uma perfeita sintonia entre anúncio e vivência, entre doutrina e prática. É o que nos dizem os Atos dos Apóstolos: Em minha primeira narração, ó Teófilo, contei toda a seqüência das ações e dos ensinamentos de Jesus (At 1,1). E também: Vós sabeis como Deus ungiu a Jesus de Nazaré com o Espírito Santo e com o poder, como ele andou fazendo o bem e curando todos os oprimidos do demônio, porque Deus estava com ele (At 10, 38).
02. Pelas suas ações, bem como pelas suas palavras, Jesus revelou-nos, desde o início, a sua identidade, a sua autoridade e a sua missão. A exemplo dos pecadores em processo de conversão Jesus, recebendo o batismo, com esse gesto, se solidariza com eles e manifesta a sua firme decisão de não mais se separar deles. Seu batismo é uma espécie de batismo da humanidade e uma antecipação de sua ação redentora. E isto vai servir de referencial para toda a sua vida e, inclusive, para a sua morte: Mas devo ser batizado num batismo (o batismo de sua Paixão); e quanto anseio até que ele se cumpra (Lc 12,50).
Jesus levou tão a sério o seu batismo que, mais tarde, também batizava: Em seguida, foi Jesus com seus discípulos para os campos da Judéia, e ali se deteve com eles, e batizava (Jo 3,22; cf. 3,26; 4,1-2). O Pai afirmou: Tu és o meu Filho muito amado. Também a cada um de nós, batizados em Cristo, Ele dirige iguais palavras consoladoras. Portanto, todo aquele que é submerso nas águas batismais, é também chamado de “filho amado”, ungido pelo Espírito e enviado para que produza frutos...
03. “O batismo faz de Jesus o vocacionado do Pai por excelência. E doravante vai ser, viver e agir de conformidade com aquilo que lhe é próprio, como Filho de Deus e Salvador. Nele a humanidade é chamada à santidade, a criar uma identidade vocacional e a assumir uma missão. Como o batismo de Jesus no Jordão representou o início da sua missão profética, para a revelação da sua divindade e identidade, da sua autoridade e da sua missão salvífica, assim o batismo cristão é a fonte e a origem de todas as vocações”. Jesus sempre revelou essa consciência e espera que nós façamos o mesmo ao longo da nossa vida cristã e possivelmente consagrada num futuro não muito distante.
04. Nosso confrade Frei José C. Pedroso nos fala: Em Francisco e Clara encontramos um Cristo muito concreto, em que a base doutrinária é sólida, mas o esqueleto da doutrina é abundantemente revestido de carne: eles choram e se comovem com o seu Cristo, eles se transformam pelo seu Cristo, eles transformam o próprio Cristo. O seu Cristo é muito real... É um Cristo generoso, no presépio, na Eucaristia e na Cruz, mexendo com o quotidiano de suas vidas..., dando sentido, continuamente, ao desejo enorme de felicidade sem limites que os avassalava.
Jesus foi o grande e apaixonado modelo de vida para o nosso pai espiritual, São Francisco de Assis. Dele se diz: Além disso, os irmãos que conviveram com ele sabiam quão cotidiana e contínua fora na boca dela a conversa sobre Jesus, quão doce e suave a sua maneira de falar e quão benigna e cheia de amor a maneira de conversar sobre ele. A boca falava da profusão do coração (cf. Mt 12,34)... Realmente, ele tinha muitas coisas com Jesus: sempre trazia Jesus no coração, Jesus na boca, Jesus nos ouvidos, Jesus nos olhos, Jesus nas mãos, Jesus nos demais membros (1Cel 115,3-4a.5).







II - BATISMO, FONTE DE TODAS AS VOCAÇÕES

Frei José Soares da Silva, Ofmcap. (Org.)

01. Continuando nossas reflexões dentro do nosso ano de animação vocacional, meditaremos hoje sobre o Batismo. Logicamente, está ele incluído na relação dos 7 sacramentos da Nova Lei, todos instituídos por Jesus. Os sacramentos são sinais visíveis e eficazes da graça de Deus, confiados à Igreja. Canais da mesma graça divina, produzem os frutos naqueles que os recebem devidamente preparados. Graça é o favor, o socorro gratuito que nos é dado por Deus para responder ao seu convite: tornar-nos filhos seus adotivos, participantes da natureza divina (cf. Jo 1,12-18; 2,3; Rm 8,14-17; 2Pd 1,3-4).
02. O Batismo é o fundamento de toda a vida cristã, o pórtico da vida no Espírito e a porta que se abre para a recepção dos demais sacramentos. Ele nos regenera pela água na Palavra. Batizar significa “mergulhar”, “imergir”. O “mergulho” na água simboliza o sepultamento do catecúmeno na morte de Cristo, da qual com Ele “ressuscita, qual nova criatura”. É um banho de regeneração que acontece a partir da água e do Espírito Santo: Ninguém, a não ser que nasça da água e do Espírito, pode entrar no Reino de Deus (Jo 3,5). Em outras palavras, é um ato litúrgico de iniciação no Cristianismo, através do qual somos incorporados e configurados a Jesus Cristo. Trata-se de um banho iluminador:
*       Todo aquele que está em Cristo é uma nova criatura. Passou o que era velho; eis que tudo se fez novo (2Cor 5,17);
*       Porque a circuncisão e a incircuncisão de nada valem, mas sim a nova criatura (Gl 6,15);
*       Outrora éreis trevas, mas agora sois luz no Senhor; comportai-vos como verdadeiras luzes (Ef 5,8);
*       Porque todos vós sois filhos da luz e filhos do dia. Não somos da noite nem das trevas (1Ts 5,5);
*       E, não por causa de obras de justiça que tivéssemos praticado, mas unicamente em virtude de sua misericórdia, ele nos salvou mediante o batismo da regeneração e da renovação, pelo Espírito Santo que nos foi concedido em profusão, por meio de Cristo, nosso Salvador (Tt 3,5-6);
*       Lembrai-vos dos dias de outrora, logo que fostes iluminados... (Hb 10a,32).
03. Na Vigília Pascal a Igreja reza: “Ó Deus, pelos sinais visíveis dos sacramentos realizais maravilhas invisíveis. Ao longo da história da salvação, vós vos servistes da água para fazer-nos conhecer a graça do Batismo”. Desde a criação do mundo, a água, esta criatura humilde e admirável, é a fonte da vida e da fecundidade. Nosso pai São Francisco a exalta: “Louvado sejas, meu Senhor, pela irmã Água, que é mui útil e humilde, e preciosa e casta”. No Antigo Testamento são figuras do Batismo: a Arca de Noé (cf. Gn 7-8); a travessia do Mar Vermelho (cf. Ex 14); a travessia do Jordão (cf. Js 3).
04. O Batismo é o mais belo dom de Deus, um verdadeiro tesouro. É, por conseguinte, chamado de: dom, graça, iluminação, veste de incorruptibilidade, banho de regeneração, selo e tudo o que existir possa de   precioso, de valioso. Tem ele as suas exigências, as suas implicações. Faz-nos uma só e mesma Igreja, torna-nos sacrários da Trindade, supõe coerência entre fé e prática e disponibilidade para sermos testemunhas do Ressuscitado, anunciando o Reino (cf. Ef 2,19-21; 4,3-6; 1Cor 3,16-17; 4,3-6; At 12,5;  At 1,8; Mt 28,19; Jo 20,21).
05. Francisco, servo e amigo do Altíssimo, a quem a divina Providência impôs esse nome, para que a partir de especial e não habitual nome a fama do magistério dele se difundisse mais rapidamente por todo o mundo, foi chamado de João pela própria mãe, quando de filho da ira, renascendo pela água e pelo Espírito Santo, se tornou filho da graça (1Cel 3,1). Intensamente ele viveu a sua vocação batismal, sobretudo a partir do momento em que a Palavra o tocou em profundidade (cf. 1Cel 22). Isso é generosidade!





I VOCAÇÃO E VOCAÇÕES 
Frei José Soares da Silva, Ofmcap. (Org.)

01. Neste início de mais um ano de encontros vocacionais, partamos do princípio de que, em última análise, inspirando-nos na própria Bíblia, existe apenas uma vocação, que é a vocação à santidade: Sede santos, pois eu sou santo, eu, o Senhor, vosso Deus (Lv 19,2). O mesmo Jesus retoma essa proposta, quando afirma: Portanto deveis ser perfeitos como o vosso Pai celeste é perfeito (Mt 5,48). São Paulo e São Pedro comungam da mesma idéia, ao dizerem: Nele ele nos escolheu antes da fundação do mundo, para sermos santos e irrepreensíveis diante dele no amor (Ef 1,4); Porque está escrito: ‘Sede santos porque eu sou santo’ (1Pd 1,6). Vejam-se também os seguintes textos: Ex 20,30; Lv 11,44; 20,7.26.40; Sb 2,23; Rm 1,7; 1Cor 1,2.
02. Com o passar dos tempos, muitos termos vão se enriquecendo de novos significados. “Vocação”, palavra que na sua origem ou etimologia quer dizer “ato de chamar”, “convite”, “apelo”, “chamado”, biblicamente falando, é proposta de Deus dirigida ao ser humano, esperando dele uma resposta. Entre as diversas vocações bíblicas, citamos as de: Abraão (Gn 12,1); Moisés (Ex 3,10); Isaías (Is 6,8-9); Jeremias (Jr 1,5-7); Ezequiel (Ez 2,3); Maria (Lc 1,30-31); João Batista (Lc 3,2-3); Apóstolos (Lc 6,12-16). Todas elas, igualmente como outras vocações de teor eclesial, têm sentido somente na medida em que estão endereçadas à busca da santidade, visando sobretudo o bem espiritual da comunidade.
03. João Paulo II, na Exortação Apostólica Pastores Dabo Vobis (29.03.1992), define de maneira profunda e rica a vocação sacerdotal: É um específico testemunho do primado do ser sobre o ter, é reconhecimento do sentido da vida como dom livre e responsável de si mesmo aos outros, como disponibilidade para colocar-se inteiramente como sacerdote ao serviço do Evangelho e do Reino de Deus. Face às mutações do termo, hoje se fala em vocações: sacerdotal, religiosa, matrimonial, para os diversos ministérios, como igualmente em vocações no sentido profano da palavra...
                A experiência mostra que o surgimento e o desenvolvimento da vocação religioso-sacerdotal nas crianças, nos adolescentes e nos jovens enfrentam dificuldades e solicitações, tais como:
a) o fascínio da chamada “sociedade de consumo”, que leva muitos a verem e a viverem a vida de uma maneira individualista, materialista e hedonista. Para os seguidores deste estilo de vida, o bem-estar materialista impõe-se como único ideal de vida, onde se recusa tudo o que supõe sacrifício e renúncia para se viverem os valores espirituais e religiosos;
b) visão distorcida da sexualidade humana, que faz perder o senso da sua dignidade e da sua beleza como serviço à comunhão e à doação entre as pessoas, reduzindo-se simplesmente a um bem de consumo. Perde-se de vista aquele crescimento harmonioso e alegre da própria personalidade;
c) experiência distorcida da liberdade que, em vez de ser obediência à verdade objetiva e universal, torna-se como que uma adesão cega às forças do instinto e à vontade de poder de cada um.
04. De outro lado, em contraposição a esses sinais negativos, existem também sinais positivos. Esses despertam ou suscitam e alimentam no coração dos adolescentes e dos jovens uma nova disponibilidade, isto é, uma procura verdadeira e própria de valores éticos e espirituais que, pela sua natureza, oferecem o terreno propício para o itinerário vocacional em vista do dom total de si a Cristo e à Igreja na vida religioso-sacerdotal. As muitas experiências de voluntariado, hoje em dia, são altamente educativas neste sentido, tornando-se indícios de vocação... Nosso pai espiritual S. Francisco de Assis é modelo de uma vocação doação-serviço, plena de generosidade.
05. Um dos encontros marcantes na caminhada vocacional de S. Francisco foi, sem dúvida, o apelo do Crucificado de São Damião, assim descrito pelo seu primeiro e grande biógrafo, Frei Tomás de Celano: Já transformado no coração, devendo em breve transformar-se totalmente no corpo, num certo dia anda perto da igreja de São Damião. Conduzindo-o o espírito, ao entrar para rezar, prosternando-se suplicante e devoto diante do Crucificado e tocado por visitações insólitas, sente-se diferente do que entrara. Imediatamente a imagem de Cristo crucificado, movendo os lábios da pintura, o que é inaudito desde séculos, fala-lhe, enquanto ele está comovido.  Chamando-o, pois, pelo nome, diz: ‘Francisco, vai e restaura minha casa que, como vês, está toda destruída’ (2Cel 10,1-4).


Vamos pensar?


1. Vocação é dom. Qual deve ser, portanto, nossa atitude na condição de vocacionados? 

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